Reflexões sobre o Auxílio Emergencial e Seus Impactos no Brasil
O auxílio emergencial, sancionado em 2 de abril de 2020, se tornou um tema central nas discussões sobre economia e políticas sociais no Brasil. Embora o noticiário da época não tenha lhe dado o destaque que merecia, logo após, o cenário mudou e o programa revelou-se uma válvula de escape para milhões de brasileiros. No primeiro dia, 18 milhões de pessoas se inscreveram para receber os R$ 600, cifra que simbolizava uma busca desesperada por alívio financeiro em tempos de crise.
O contexto do auxílio emergencial foi marcado pela pandemia de Covid-19, que trouxe desafios sem precedentes para a saúde pública e a economia. Nos dias seguintes ao lançamento do programa, outras notícias dominaram as capas dos jornais, como declarações de Luiz Henrique Mandetta, o então ministro da Saúde, e estudos sobre o impacto do vírus nas comunidades vulneráveis. Contudo, esse ato de assistência social foi um divisor de águas para a população brasileira. Se no início eram cerca de 18 milhões de beneficiários, esse número cresceu significativamente, alcançando 67 milhões de pessoas que foram diretamente impactadas pelo auxílio.
Metade da população brasileira foi afetada de forma direta, pois residia em domicílios onde pelo menos um membro foi protegido pelo auxílio. Estudos realizados por matemáticos, como Vinicius Albani, da UFSC, apontam que, sem essa ajuda, o número de mortes poderia ter atingido patamares alarmantes durante os primeiros meses da pandemia.
Os impactos do auxílio emergencial se estenderam para além da questão humanitária. Politicamente, a situação se transformou: o ex-presidente Bolsonaro obteve mais votos no Nordeste nas eleições de 2022 em comparação a 2018, resultado possivelmente relacionado ao programa de assistência. Em resposta à pressão do eleitorado, o presidente prometeu a reedição do auxílio antes das eleições, enquanto o atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva comprometeu-se a torná-lo permanente e integrá-lo ao novo Bolsa Família. Com isso, o orçamento destinado a esse programa quintuplicou em relação aos níveis pré-pandemia, contribuindo para a redução drástica da pobreza e da extrema pobreza no país.
Entretanto, o cenário não é unidimensional. Embora empregadores relatem escassez de mão de obra, economistas manifestam preocupação com a dívida pública e as taxas de juros. Além disso, o debate sobre o impacto do auxílio na inflação dos alimentos merece atenção. Quais são as formas de consumo das famílias beneficiadas? Como suas vidas mudaram? Quais setores comerciais se beneficiaram mais dessa injeção de recursos? Há também manifestações culturais que emergiram nesse contexto, como músicas que abordam a experiência vivida durante a pandemia.
A discussão sobre a sustentabilidade do programa é crucial. Apesar de preocupações recorrentes com fraudes e sugestões de reforma, as regras do auxílio não foram suficientemente adaptadas e permanecem semelhantes às de quando o programa era muito menor. Isso levanta questões sobre como a pobreza infantil, que teve uma queda tímida com o Bolsa Família, pode ser combatida de forma mais eficaz em um cenário em que o programa cresceu enormemente.
Atualmente, os R$ 600 que antes pareciam um alívio expressivo representam, na prática, algo em torno de R$ 447, ainda assim quase o dobro do que era oferecido antes de abril de 2020. O que está em jogo agora é a redefinição do papel do governo na assistência social e como o Brasil pode moldar seu futuro considerando as lições aprendidas ao longo dessa trajetória. A transformação social e econômica que o auxílio emergencial proporcionou pode ser um catalisador para uma discussão mais ampla e necessária sobre a verdadeira sustentabilidade das políticas públicas de assistência.
Leia a matéria na integra em: www.estadao.com.br