Transformações Estruturais e os Desafios do Brasil no Cenário Global
Celso Amorim, ex-chanceler e atual assessor especial do presidente Lula (PT), considera que o mundo está passando por uma das mais significativas transformações estruturais da história recente. Para ele, a ascensão de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos desmascarou a hipocrisia que permeava o multilateralismo.
Amorim observa que, ao desafiar a ordem mundial estabelecida e renegar a condição de superpotência, Trump tem, de forma direta, defendido os interesses norte-americanos. “É preciso se reorganizar diante de novos desafios”, afirma o diplomata.
O Impacto da Hipocrisia no Multilateralismo
Questionado sobre a possibilidade de Trump adotar a mesma narrativa de certos setores do Brasil, que alegam viver sob uma “ditadura judicial”, Amorim expressou que o ex-presidente Jair Bolsonaro “ficou pequeno diante das grandes questões do mundo”. Segundo ele, Trump respeita o poder e não aqueles que buscam adulação.
Rumo a um Mundo Multipolar
Amorim discorre sobre a inevitável transição do cenário global, onde o mundo deixa de ser dominado por uma única potência. Ele cita o secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, que já aponta para uma nova ordem multipolar. “Nós estamos vivendo a hora da verdade”, afirma Amorim, referindo-se aos interesses que agora se tornam mais evidentes.
O ex-chanceler exemplifica que, desde a queda do muro de Berlim e a dissolução da União Soviética, o mundo tem passado por grandes transformações. Neste novo cenário, os EUA não mais operam exclusivamente pelos interesses de uma governança multilateral, mas sim em função do seu próprio autointeresse, algo que se reflete na postura do atual presidente.
Desafios e Oportunidades para o Brasil
No contexto atual, Amorim aponta que o Brasil deve aprender a navegar em um mundo multipolar, onde alianças variáveis são fundamentais. “Devemos nos fortalecer na América do Sul e, ao mesmo tempo, nos relacionar de forma inteligente com as superpotências”, sugere. A mudança de paradigma exige do Brasil uma nova estratégia em suas relações internacionais.
Com a China se afirmando como uma potência a ser considerada, Amorim destaca a necessidade do Brasil em integrar melhor seus interesses às dinâmicas regionais e mundiais. De acordo com ele, o Sul Global está se fortalecendo, e o Brasil precisa aproveitar essa oportunidade para se consolidar como uma liderança no continente.
A Europa e Suas Novas Desafios
Segundo Amorim, a Europa também está sendo obrigada a se reinventar diante do novo comportamento dos Estados Unidos sob a presidência de Trump. Os europeus, que estavam habituados a viver sob a proteção americana, precisam encontrar sua autonomia. “A Europa vai ter que se libertar da obsessão de que vai ser invadida pela Rússia”, analisa o ex-chanceler.
O Papel do Brasil no Cenário Internacional
Amorim faz uma ressalva sobre a divisão atual na América do Sul, enfatizando que, apesar das dificuldades, o continente tem potencial para se unir novamente. Ele ressalta que enquanto alguns países se afastam do Brasil, a tendência é que, a médio prazo, a maioria busque reaproximação.
A independência do Brasil em sua política externa é um ponto central no discurso de Amorim. Ele sugere que, em vez de se alinhar cegamente a potências, o Brasil deve fortalecer suas relações com países da América do Sul, garantindo assim uma voz mais robusta no cenário internacional.
Por meio de um entendimento mais profundo de suas próprias capacidades e limitações, o Brasil pode se posicionar enquanto ator relevante, evitando a dependência de outras nações e buscando parcerias que respeitem sua soberania. Segundo Amorim, o importante neste momento é não ser colônia de ninguém.
O Futuro das Relações Brasil-EUA
Amorim acredita que o Brasil deve estabelecer um diálogo mais produtivo com a administração Trump, especialmente à luz das tarifas de importação que afetam o país. Ele defende que é crucial agir de forma recíproca, preservando os interesses brasileiros enquanto constrói um espaço para negociações.
Em um mundo em constante mudança, a sapiente condução das relações externas e a capacidade de adaptação do Brasil serão fundamentais para sua sobrevivência e prosperidade no cenário global.
Com a competitividade das grandes potências em ascensão, o Brasil precisa ser proativo em seu papel. O fortalecimento das instituições e da diplomacia brasileira será uma peça chave no xadrez geopolítico que se desenha. Amorim conclui que é essencial que o Brasil permaneça vigilante e estratégico, afinando seu discurso e suas ações para se adaptar às novas realidades do cenário mundial.
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