Transformações Urbanas: Pedalando pelo Centro do Rio
Por José Augusto C. Fernandes
Pedalar pelo Centro do Rio aos domingos revela sinais claros de transformação. Há mais de cinco anos, tenho feito desses passeios de bicicleta um ritual para observar as mudanças na paisagem urbana. O que mais me chama a atenção é o renascimento de prédios antigos, agora convertidos em residências, e o surgimento de novos edifícios onde antes havia abandono.
Uma Nova Fronteira
Esse movimento de revitalização, que já transformou cidades como Bilbao, Bordeaux, Buenos Aires e Madri, ganha forma no Rio, embora com suas particularidades. Enquanto, em outras metrópoles, as áreas recuperadas estão próximas de bairros residenciais tradicionais, no Rio, o Centro e a Região Portuária estão distantes dos grandes núcleos residenciais, o que torna a mudança um desafio.
Clusters de Vida
O segredo para essa transformação se esconde nos “clusters” — agrupamentos de projetos que, juntos, criam uma sensação de segurança e atraem serviços essenciais para quem escolhe viver no Centro. Durante minhas pedaladas, percebo esses clusters surgindo, e no futuro, espero que se conectem, formando um verdadeiro arquipélago de vida urbana.
Áreas em Transformação
Atualmente, esses agrupamentos ainda estão incipientes e podem ser encontrados em regiões como Praça Mauá-Presidente Vargas, Visconde de Inhaúma, Sacadura Cabral, Cinelândia, Senador Dantas, Marrecas, Passeio, Lapa, Beira-mar/Santos Dumont e Porto Maravilha, abrangendo áreas como Saúde, Gamboa, Santo Cristo, Impa e Rodoviária. Cada uma dessas regiões tem sua personalidade: algumas emergem de retrofits, onde prédios comerciais são convertidos em residências; outras resultam de projetos urbanísticos mais amplos, como o Porto Maravilha, e há aquelas que se expandem a partir de núcleos já residenciais, como Bairro de Fátima/Cruz Vermelha.
Novas Sinais de Vida
O que mais encanta nesse processo é perceber os sinais de vida que começam a se instalar. Recentemente, encontrei um café aberto às 9h de domingo na Avenida Rio Branco, nas proximidades de prédios recém-reformados na Visconde de Inhaúma já habitados. As primeiras plantas nas janelas, moradores entrando nos edifícios… cenas simples, mas que simbolizam o início da volta da vida ao Centro. Caminhando pelos armazéns do Porto, percebo novos moradores ou talvez aqueles do pioneiro projeto do arquiteto Demetre Anastassakis, no pouco conhecido Morro da Saúde.
Diversidade nos Projetos
A diversidade de projetos é um ponto positivo para essa revitalização. Muitos são de uso misto, com comércio e serviços nos andares térreos, facilitando a vida dos moradores e atraindo visitantes. Conforme mais pessoas ocupam esses espaços, há um crescimento na oferta de serviços e na vitalidade do entorno. Fico curioso em saber como a área próxima ao Impa e à Rodoviária se desenvolverá, especialmente onde uma ruela arborizada, ligando o Impa aos prédios do entorno, já se destaca como um pequeno oásis urbano. Não muito longe, o Terminal Gentileza se apresenta como um dos projetos arquitetônicos mais inovadores da cidade, oferecendo vistas deslumbrantes da Baía de Guanabara, da Serra dos Órgãos e uma chaminé de tijolos que é uma relíquia industrial.
A Colaboração é Fundamental
Para que essa transformação ganhe força, é fundamental a colaboração entre o setor público e a iniciativa privada. A segurança é essencial. O Centro do Rio já abriga infraestrutura, ativos culturais e naturais que merecem ser desfrutados por mais pessoas, proporcionando qualidade de vida a quem decidir viver ali.
O Papel de Todos
Urbanistas, empresários, gestores culturais e moradores têm um papel vital nesse processo. Transformações urbanas não acontecem da noite para o dia; elas exigem tempo e continuidade. Os investimentos atuais são promissores e podem estimular novas iniciativas. Acompanhar de perto essa evolução — pedalando pelas áreas em transformação — é uma forma de observar uma história em construção e se inspirar para colaborar com essas mudanças.
*José Augusto C. Fernandes é economista
Leia a matéria na integra em: oglobo.globo.com